Afinal
quem é que quer ter razão?
Ao contrário do que acreditamos, a realidade não
acontece dentro da cabeça.
Dentro da cabeça acontece uma interpretação da
realidade. E a mente acredita que a interpretação é a realidade.
Um exemplo disto:
Entro numa loja e sou atendido por uma mulher que
me pergunta como me pode ajudar. Realidade. A mente observa a mulher, a sua
postura, tom de voz, expressão facial e interpreta como “mulher antipática,
grosseira, mal-educada que está obviamente a fazer um frete”. E eu irei reagir
à minha interpretação da realidade, colocando de parte a totalidade da
experiência. E a totalidade da experiência é que há um ser humano disponível
para me ajudar da melhor maneira que é capaz naquele momento. Pode ser que
aquela seja a sua expressão facial. Pode ainda ser que aquela mulher tenha
recebido más notícias nesse dia. Pode ser mil e uma coisas. Mas a mente, que se
julga no centro do universo, decide que merece um tratamento especial, que
merece ser atendida por alguém com um sorriso de orelha a orelha, etc.
Aprendi há algum tempo que ninguém precisa mais de
um sorriso do que aquela pessoa que não tem nenhum para dar. Aprendi ainda que
é fácil sermos simpáticos e bem-educados para com aqueles que são prestáveis,
concordam com as nossas opiniões, sorriem e parecem estar de bem com a vida.
Não há qualquer desafio ou dificuldade em sermos amáveis para com estas
pessoas.
O desafio, e a alegria de viver, encontra-se em
sermos amáveis para com aquela pessoa que aparentemente não está bem, que
aparentemente é mal-educada ou insensível.
A nossa mente adora generalizar. É uma forma de
simplificar a realidade. “Os políticos são corruptos”, “as mulheres são
fracas”, “ninguém me ama”, “ando sempre cansado”, etc. Estas generalizações
aparentemente simplificam a nossa vida, não temos que prestar muita atenção à
realidade. Se ninguém me ama não tenho que sentir-me grato pelo sorriso do
idoso quando vou para o trabalho. Se ando sempre cansado não tenho que me
dedicar aos meus sonhos quando chego a casa ao fim do dia. Se as mulheres são
fracas posso abusar da ajuda de uma colega no trabalho. Se os políticos são
corruptos posso questionar a honestidade de qualquer declaração feita por um.
Uma forma de começar a descobrir a realidade e
despertar para as mentiras da mente é começar a escrever as minhas
generalizações. Por exemplo, eu acreditava que “as pessoas só são simpáticas
quando querem qualquer coisa”, “ninguém me compreende”, “a vida é muito
difícil”, “o meu trabalho é esgotante”. Depois de escrever as generalizações
procura pelo menos três situações em que o oposto é prova da mentira inicial,
da generalização. Por exemplo, “ninguém me compreende”. Três situações em que
fui compreendido. “A vida é muito difícil”, três situações em que a vida foi
muito fácil.
Ah! E a melhor generalização de todas: “Eu não sou
capaz!” És capaz de encontrar dez situações em que apesar de acreditares que
não eras capaz, foste? Delicia-te a descobrir.
Outra atitude que me ajudou bastante foi a de ter
apenas uma certeza: eu não sei. Quando a mente não sabe torna-se disponível a
muitas possibilidades, muitas formas de responder a uma situação. A mente que
não sabe faz muitas perguntas, exceptuando a favorita: porquê?
As pessoas já sabem o porquê. Sabem porque estão deprimidas,
porque não falam com a mãe, porque se irritam, porque não descansam, porque
estão ansiosas.
A mente que não sabe faz outro tipo de perguntas.
Como sabe que está deprimida? O que é que tem que fazer para se sentir
deprimida? Como sabe quando não é para se sentir deprimida? O que tem que
pensar para se deprimir? Que imagens vê na mente para ficar deprimida? E será
que o oposto daquilo que pensa é tão ou mais verdade?
A mente que não sabe quer saber. E não acredita em
problemas. Prefere acreditar em histórias que a mente conta para se validar. A
função da mente é ter razão. E se a mente acredita que “as pessoas são
interesseiras” irá provar a si mesma que tem razão. E irá esquecer-se de todas
as situações em que as pessoas foram amáveis ou atenciosas e não havia qualquer
interesse.
E a única forma de trazer a mente de volta à
realidade é escrevendo. Quando escrevemos não conseguimos escapar. Não
conseguimos ter razão. Está ali, no papel.
Desejo a todos os queridos amigos uma excelente
descoberta no planeta das generalizações.
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